Lucélia Muniz
Ubuntu Notícias, 16 de setembro de 2020
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Por Antônio Hélio da Silva – Cronista e Jornalista
Bolhas velozes passavam na mangueira transparente. Acompanhavam a água que caia no tronco do meu pé de acerola, no quintal de minha casa na Rua Santo Antônio nº 120, centro. Davam estalinhos mais suaves do que bombinhas de São João (aquelas que a gente taca no chão e elas explodem). Porém com duas diferenças: em vez de fumaça e fogo, saia água e ar. Caídas no tronco, as bolhinhas disputavam espaço sobre a água, com folhas secas e pequeninos garranchos.
Toda tardinha, aquela cena era comum em nosso quintal. As formiguinhas pretas e vermelhas já não ficavam naquele horário no chão do tronco do pé de acerola. Sabedoras da hora, não esperavam acontecer. “Davam no pé”, sob pena de perecerem afogadas ou cuspidas longe pelo impacto inevitável do ar comprimido que saia da mangueira.
Naqueles finais de tarde, com meu rosto pigmentado pelo vermelho abóbora vindo do Oeste, resteado pelas folhas das árvores dos outros quintais, eu filosofava comigo mesmo sobre as funções da água no planeta. E quão salutar e deliciosa era para o meu pé de acerola, aquela árvore santa! Agradecida por mais um cuidado que eu lhe prestava rotineiramente, incluindo a desbastação dos galhos secos, o pé de acerola se enfeitava todinho para mim e meus filhos, com muitíssimas folhas novas: verdes como o lírio mais vaidoso da revença do açude Paraíso. As florzinhas lilases, depois ficando amarelas, passando a brancas, davam colorido especial no pé de acerola e em minha vida, para compensar a saudade de minha amada que se foi para sempre sem “nem se despedir de mim”.
Certa vez, para grata surpresa, ao verificar as galhas, vi minúsculos frutinhos ainda arrimados pelas pétalas, prestes a concluírem suas funções fecundativas. Aí não pude ficar indiferente as ações sagradas e lindas daquela árvore e da mãe natureza em prol de mim e confidenciei aquela maravilhosa árvore: mesmo você não estando nas fases da sua santa gestação, vou cuidar de você com muito mais carinho a partir de hoje. Você aí fincada nesse barro duro, deve estar no limite de suas forças para extrair nutrientes a se manter com todo esse rejuvenescimento, a ponto de atrair as sagradas abelhas. Numa algazarra de agito e confraternização, as abelhas e borboletas polinizavam as flores que ainda não tinham frutos.
Fotografia ACEROLA - Lucélia Muniz |
Ao saborear os primeiros copos de sucos, eu ia ao pé de acerola, dizer obrigado pelas vitaminas C que me destes. Agradecia também, a distância, as abelhas e as borboletas, que já estavam noutras paragens ou verbenas, providenciando o equilíbrio fecundador do universo.
Hoje fico a indagar ao tempo, se
já não é hora de agirmos como as plantas, os insetos, as borboletas e as abelhas,
no seu evangelho com as flores, interagindo na sustentabilidade do planeta.
Texto produzido em 11.10.2005.
Araripe – Ceará, 14 de setembro de 2020.
Muito bom mesmo
ResponderExcluirNão me canso de ler os seus textos! Eu amo essa leveza que é proporcionada em cada frase e a forma mágica como cada palavra me envolve. Parabéns 👏🏼
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